Kabengele Munanga, natural do Congo, chegou no Brasil em
1975. Na Universidade de São Paulo se dedicou a estudar e ensinar as
relações raciais e interétnicas. É referência na luta contra a
desigualdade racial e pelo respeito à população negra do país. Neste
texto, que integra o volume 6 da coleção “2003-2010 O Brasil em
transformação”, organizado por Matilde Ribeiro (edição da Editora
Fundação Perseu Abramo, no prelo), o professor Kabengele fala sobre as
políticas afirmativas a partir do governo Lula, o mito da democracia
racial, a presença do racismo na sociedade brasileira e o papel da mídia
na manutenção do status quo. O professor também aponta os desafios para
o país e para o novo governo e fala sobre suas expectativas.
Jornal A TARDE - sábado, 4 de maio de 1968.
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"Num país democrático e de direitos são importantes os avanços legais,
porque as leis funcionam como um grande guarda-chuva protetor de todos
nossos direitos enquanto cidadãos e cidadãs. Mas as leis sozinhas não
são suficientes para resolver todos os problemas de uma sociedade. Temos
de ir além delas para conjugar a igualdade formal com a igualdade
material. A Constituição de 1988 é excelente e considerada como uma das
mais avançadas do mundo, mas e daí? Há acordo que o Estado, os governos e
os demais responsáveis pelo investimento nas políticas universalistas?
Não tenho dúvida de que deva haver investimento na melhoria dos serviços
públicos como as escolas, a saúde etc. Mas é preciso cruzar as
políticas universalistas com as políticas específicas ou focadas capazes
para atingir os segmentos da sociedade que, por motivos históricos e
estruturais, têm perdas acumuladas e atrasos em matéria do seu
desenvolvimento coletivo, que jamais as políticas macrossociais poderão
reduzir. Ou seja, praticar a discriminação positiva, ou como preferem
alguns, tratar desigualmente os desiguais. Perante a lei somos todos
iguais, está correto, mas em formulação de políticas públicas não
devemos ficar presos a esse princípio de isonomia, pois seria uma
negação de nossas diferenças sociais, de gênero, de religião, de idade,
de etnia, de classe.
As políticas que defendem os verdadeiros direitos humanos devem
ser as que dão conta do conjunto das necessidades das pessoas e
coletividades e não se percam na generalidade e na abstração. Para serem
concretas essas políticas devem defender os direitos humanos
acompanhados de ações, de programas e de projetos efetivos de mudança,
de transformação da sociedade em sua complexidade e diversidade."
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