PERIPIRI UMA FAZENDA QUE SE TORNOU BAIRRO NO SUBÚRBIO DE SALVADOR



Em idos de 1801, dirigiu-se o Tabelião Manoel Ribeiro de Carvalho a residência do casal Francisco Lopes de Araújo Villas Boas e Ana Maria de Almeida, para lavrar escritura de troca e permutação das fazendas Piripiri e Sapoca, com o casal Francisco Gomes de Souza e Maria Madalena de Souza. Através deste documento de escritura é possível levantar a cadeia sucessória da dita fazenda, hoje Bairro de Peripiri, Subúrbio de Salvador, trazendo luz sobre a sua história. Além da indicação dos antigos proprietários é possível verificar a extensão da propriedade, seus limites com outras fazendas, como a dos Coutos, hoje Bairro de Fazenda Coutos, o tipo de negócio ali estabelecido, neste caso a lavoura de cana de açúcar e a produção de farinha de mandioca e cachaça e ainda utilização de pessoas escravizadas com a indicação de suas senzalas. As escrituras aqui transcritas, de forma parcial, fazem parte do Projeto: Programa de Arquivos Ameaçados, e encontram-se disponíveis no site:  https://eap.bl.uk/search?query=EAP703 Mas também podem ser consultadas no Arquivo Público do Estado da Bahia através de agendamento prévio pelo E-mail: cadd.apeb@fpc.ba.gov.br


Escritura de troca e permutação que fazem Francisco Lopes de Araújo Villas Boas e sua mulher Dona Ana Maria de Almeida da sua Fazenda chamada Piripiri, com Francisco Gomes de Souza e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza com a sua Fazenda chamada Sapoco como abaixo se declara

Saibam quantos este público instrumento de Escritura de troca e permutação ou como em direito melhor nome e lugar haja virem, que sendo no ano do Nascimento do Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e um aos vinte e três dias do mês de outubro do dito ano nesta Cidade do Salvador Bahia de Todos os Santos e casas de morada de Francisco Gomes de Souza onde eu Tabelião fui chamado, sendo ali apareceram presentes partes a esta outorgantes havidos e contratados a saber, de uma o dito Francisco Gomes de Souza e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza, da outra Francisco Lopes de Araújo por si e como procurador de sua mulher Dona Ana Maria de Almeida como se o fosse ser pela procuração que apresentou em que lhe da o poder... E logo por este foi dito a mim Tabelião perante as testemunhas adiante nomeadas e assinadas que ele dito e sua mulher, legítimos senhores e possuidores de uma Fazenda de terras próprias chamada Piripiri sita na Freguesia de Nossa Senhora do Ó de Paripe, com sua casa de vivenda, um telheiro, casa de fazer farinha, tudo coberto de telha e algumas senzalas cobertas de palha, cujas terras são de plantar canas e mandiocas, com suas matas de madeira de lei com canas e mais benfeitorias que na dita Fazenda se acharem, e tem de frente pela praia duzentas e cinquenta e três braças e meia e de comprimento, pelas parte do Norte mil novecentas e quarenta e sete braças e seis palmos e de largura nos fundos quinhentas e treze braças, partem pelo Sul com terras de Francisco Teixeira dos Santos desde a Praia até os fundos, e pelo Norte com terras de José Pinheiro de Queiroz até o Rio Pirajá, e pelo Noroeste com o mar salgado, os fundos vão terminar com terras de Dona Elena da Silva Sampaio e de João Barboza de Araújo, pela Estrada que vem de Cotegipe para a Estrada do Sertão e Cidade, tudo demarcado com seus marcos de pedra de uma contraparte e assim mais uma sorte de terras com todos os seus matos que nela tem, que foram de João Luiz Barreto, que pega do dito Rio chamado Pirajá para cima que foram cabeceiras da dita Fazenda de José Pinheiro de Queiroz, que partem pelo Sul com terras da Fazenda dos Coutos e nos fundos com terras do mesmo João Barboza, demarcada também com seus marcos de pedra, cujas terras e metade da dita Fazenda do Piripiri as possuem por título de compra que delas fizeram a Inacio de Mattos Felix de Menezes por escritura lavrada na nota do Tabelião Campelo, e noutra metade da mesma Fazenda a houveram por herança de seu sogro e Pai o Capitão José de Almeida Barreto, a qual Fazenda e sorte de terras assim confrontada e demarcada e com quem mais direito haja de partir, confrontar e demarcar, assim da mesma forma que a possuem livres e desembargadas de todo e qualquer encargo e melhor e melhor puder ser dele outorgante por si e com procurador de sua mulher que se achavam juntos e amigavelmente convencionados com o outorgante Francisco Gomes de Souza e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza a trocaram e permutaram com outra Fazenda que também possuem em terras próprias denominada Sapoca, com suas casas de senzalas e uma Armação na Praia, tudo coberto de telha, de plantar canas, matos e todas as mais benfeitorias e plantas de canas que nela se acha, cujas terras partem pelo Sul com a Fazenda que hoje é do Tenente João Pedro de Carvalho e pelo  Norte com terras de João do Rozario de Souza e João Francisco Pontes, e pelos fundos com a Estrada Geral que vai para São Thomé, e com terras de João Barboza de Araújo até da dita Fazenda, demarcada com marcos de pedra, cuja Fazenda possuem eles ditos Francisco Gomes de Sousa e sua mulher por compra que dela fizeram a Francisco Dias Coelho como Testamenteiro de Antonio Soares Vieira por Escritura na nota do Tabelião Antonio Barboza de Oliveira voltando estes a ele outorgante pelo excesso de maioria que há na Fazenda do Piripiri para com a da Sapoca a quantia de três contos e oitocentos mil réis que são nove mil cruzados e duzentos mil réis em desobriga daquele dito Francisco Lopes de Araújo Villas Boas deva a Inacio de Mattos Felix de Menezes e a Manoel José de Araújo Borges ou a sua Mãe Dona Ana Joaquina de Araújo Borges, assim como procurador de sua mulher Dona Ana Maria de Almeida e Francisco Gomes de Souza e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza, cada um no que lhe toca, que trocavam como logo trocaram as ditas propriedades na mesma forma que acima fica dito para que desde já logrem e hajam a possuam mansa e pacificamente como suas próprias que ficam sendo por virtude desta troca e permutação que fazem muito de suas livres vontades, modo próprio, sem constrangimento de pessoa alguma, e por este mesmo instrumento possam tomar posse cada um da Fazenda e mais benfeitorias que lhe fizerem justiça... Paripe, vinte e um de outubro de mil oitocentos e um.              

 


Escritura de venda paga e quitação que fazem Francisco Gomes de Souza e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza ao Capitão José Gomes Pereira de uma fazenda em terras próprias denominada Piripiri, cita na Freguesia de Paripe, pelo preço e quantia de 10:000$00 como abaixo se declara

Saibam quantos este público instrumento de Escritura de venda paga e quitação ou como em direito melhor nome haja virem que sendo no ano do Nascimento do Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e onze anos, ao primeiro dia do mês de agosto do dito ano nesta Cidade do Salvador e Bahia de Todos os Santos e Cartório do Tabelião Joaquim Tavares Macedo Silva para quem sirvo ali apareceram presentes partes a esta Outorgantes havidos e contratados, de um lado como vendedores Francisco Gomes de Souza Cavaleiro Professo na Ordem de Cristo e sua mulher Dona Maria Madalena de Souza e da outra como comprador José Gomes Pereira pessoas reconhecidas de mim Tabelião pelas próprias de que faço menção abaixo assinadas, que eles eram senhores e possuidores de mansa e pacifica posse a vista de todos sem contradição de pessoa alguma de uma Fazenda em terras próprias denominada Piripiri cita na Freguesia de Paripe, que parte do Norte com uma Fazenda do Setúbal do Capitão Manoel Ignacio Lisboa, até o Rio Pirajá dali para cima com a Fazenda dos Coutos, até a Estrada que sai do Macaco e dali por diante com terras de João Barboza de Araújo ou sua Mãe até a Estrada Real do Sertão, pelo Sul com terras de Francisco Teixeira, em que se acha de renda Antônio Vaz de Carvalho desde o Mar até a mesma Estrada Real do Sertão e pelo Oeste com o Mar Salgado, e pelo Leste com a mesma Estrada Real, em cuja venda senão compreende senão tão somente as terras e edifícios de pedra e cal como sejam, uma casa de alambique, outra que serve de venda e armazém, uma engenhoca de moer canas, um telheiro de queimar cal, um forno de cozer louça de barro, e a casa de vivenda já velha e arruinada. Reservando os vendedores ali todas as plantas que ali houverem, para as colherem por sua conta e todos os móveis e utensílios, digo, os móveis utensílios do lavatório do dito alambique e Fazenda, bem como todos os escravos, gados ou qualquer outros fôlegos vivos, embarcações grandes e pequenas, ferramentas e tudo o mais que por sua natureza for amovível. Cuja Fazenda assim da mesma forma acima declarada disseram eles vendedores que por este público instrumento, e ter pago a siza de um conto de réis, como constava do conhecimento que apresentou a abaixo desta vai lançado para se dar incorporado como translado da mesma escritura vendiam como logo venderam ao comprador para lhe seus herdeiros assim se foi pelo preço e quantia de dez contos de réis, cujo pagamento está p comprador obrigado a pagar-lhe em desobrigação...        

FONTES:

Arquivo Público do Estado da Bahia, Seção Judiciária Livro de Notas 144, páginas: 349v a 351v e Livro de Notas 168, páginas: 108 a 109v.

Mapa disponível em: http://vfco.brazilia.jor.br/ferrovias/Bahia/suburbios/Trem-Suburbano-Salvador-1992-mapa.shtml

Para saber mais sobre Peripiri: https://www.encontrasalvador.com.br/sobre/bairro-periperi-salvador/

DA CRIAÇÃO DE PEIXES NO DIQUE A LAPDAÇÃO DE DIAMANTES EM SALVADOR NO SÉCULO XIX

 

Em 1876, Francisco Rocha arrendara o Dique do Tororó para ali implantar uma criação de peixes para revenda na Bahia. Nesta matéria de O MONITOR, além de detalhes do contrato, o articulista narra em sua transcrição os limites da área e negócios como lapidação de diamantes no arrabaldes da cidade, trata ainda da Invasão Holandesa e suas heranças. Uma matéria para melhor conhecer a cidade no século XIX.


Ilustríssimos Excelentíssimos Senhores, Presidente e membros da Assembleia Provincial.

Diz o Doutor Francisco Antônio Pereira Rocha que tendo arrendado em 1876 a Câmara Municipal desta cidade, por espaço de 27 anos, o Dique Novo, que se estende da Fonte das Pedras até o lugar do Moinho, e seus braços que entram pelo Tororó, Garcia e Barris, outrora até a camisa de fogo do Forte de São Pedro, na propriedade do finado Manuel Alves de Sá, sob as seguintes condições:

1ª Pagar a renda de 50$000 nos primeiros nove anos, 100$000por cada um dos nove seguintes, e 200$000 por cada um dos nove anos últimos anos, ficando então todas as benfeitorias fixas pertencendo a municipalidade, que poria em hasta pública o novo arrendamento, preferindo para ele o suplicante os seus herdeiros.

2ª Plantar na margem de toda a estrada Dois de Julho um pé de Eucaliptos Glóbulos, de sessenta em sessenta palmos, e no intervalo outros tantos de Salgueiro, (chorão, saule pleureur).

3ª A povoar o mesmo Dique de peixes fluviais, das melhores espécies indicadas e outros exóticos, que podem viver entre os trópicos e se possam aclimar, visto não ser o Dique d’águas estagnadas, antes renovadas quase diariamente, despejando [...] horas, pelas duas [...] sempre abertas, mais de três mil metros cúbicos d’água potável, que alimenta os motores das duas fábricas de lapidação de diamantes, nos lugares da antiga Bate Folha, e depois do Moinho do Meira, e finalmente da fábrica do superior Rapé Areia Preta de Gantois & Paillet, vendida a Meuron & Companhia.

4ª Fazer na margem do Dique, em frente ao do novo Bairro do Tororó, que é lugar mais estreito do trânsito em canoas, para maior comodidade dos moradores do mesmo, uma casa coberta de telhas para ali ser mercado do peixe.

5ª Só aí poder vender o peixe, sob pena de 100$000 de multa; finalmente, a vender, a nunca mais de duzentos réis o peixe cada quilo, e de todo o tamanho e qualidade, sob a mesma multa, excetuando só os crustáceos.

6ª Finalmente, a dar uma vez por mês o produto de toda a pescaria daquele dia (de jejum de preceito) grátis, para ser repartido pelas casas de educação e caridade, sem que a Câmara por sua parte lhe desse o menor auxílio, exceto proibir a pesca no mesmo Dique, sem sua licença para evitar a devastação que no peixe (que ali se reproduz), de continuo fazem os meninos e os vadios, pescadores d’água doce, usando de redes de pequenas malhas, gerirés, anzóis de unha de gato e até de tingui, côcae mesmo de cal, que deu cabo do peixe, que em abundância (até o Surubi) se criava e se vendia a 80 réis o arrátel de 16 onças, fixado por edital do almotacel Bottas, ainda depois da invasão de Mauricio de Nassau, no ano de... como consta dos registros municipais, que se criava, dizemos, no Velho Dique, que, começando na horta do Convento de São Bento, entrava pala baixa da Lapa, se estendia desde a Barroquinha, Rua da Lama, atual Rua da Vala e se fechava e abria no lugar das Sete Portas, por onde despejava o Rio das Tripas, até fazer junção com o Rio Camorogipe e ia desaguar na Mariquita povoação do Rio Vermelho, como ainda hoje. Ficou, pois, o Dique Velho despovoado de peixe e foi preciso formar o atual, represando para isso por um forte morachão ou tapagem, cuja terra foi tirada como se observa da chamada Ladeira do Moinho, montículo em terreno dos antecessores do Teixeira que por isso ficou com o direito a uma das portas de esgoto, situada em suas terras que pelo represamento ficaram alagadas.

Apesar de um tão vantajoso contrato, quase se pode chamar leonino teve o suplicante de ver-se impossibilitado de dar-lhe execução, por que as câmaras conservadoras nunca trataram de formular a postura indispensável para que o suplicante tivesse uma garantia a sua propriedade, isto é: o peixe que lançasse naquele grande estuário só par acrescer e engordar, por que a fecundação e encubação dos ovos, bem como os primeiros cuidados a das aos cayorrinhas só se podem praticar em aparelhos especiais e tanques, ou rigolas apropriadas.

Agora, porém, nutre o suplicante bem fundada esperança de que os atuais vereadores, homens do progresso, não queiram por mais tempo conservar as coisas no status quo e que formularam uma postura rigorosa que vos dignareis aprovar.

FONTE: O MONITOR, 9 DE JULHO DE 1880, disponível em: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=704008&pesq=%22Bate%20Folha%22&hf=memoria.bn.br&pagfis=4116

Para saber mais sobre o Dique: http://saosalvadordabahiadetodosossantos.blogspot.com/2015/05/dique-do-tororo.html