PROCLAMAÇÃO BAHIANOS! UM ESCRITO SEDICIOSO NA BAHIA EM 1848


Em fevereiro de 1848 a Europa vivenciava a Primavera dos Povos, do lado de cá estourava a Praieira. Na Bahia, com sua longa tradição em revoltas, não seria diferente. Na manhã chuvosa do mês de fevereiro um papel despertou à atenção de um menino, logo interceptado por um agente do Estado, saltou-lhe aos olhos a palavra proclamação, não contente com o que havia lido transmite a seus superiores a intenção sediciosa do escrito. 


Ilustríssimo Excelentíssimo Senhor

Transmito ao conhecimento de Vossa Excelência o papel que sob a denominação de proclamação foi encontrado junto ao Quartel do Corpo Policial. Das minuciosas indagações a que tenho particularmente procedido não resulta possibilidade de alteração da tranquilidade pública.

Deus Guarde a Vossa Excelência por muitos anos. Bahia, 25 de fevereiro de 1848.

Ilustríssimo Excelentíssimo Senhor Desembargador

Presidente da Província

João Joaquim da Silva

 


Ilustríssimo Senhor Major Comandante Geral

Participo a Vossa Senhoria, que hoje as 6 horas da manhã estando eu na porta do Quartel, vi que um menino abaixou-se e apanhando um papel lia a palavra proclamação, então o chamando entregou-me ainda molhado o papel escrito, que com esta apresento a Vossa Senhoria, sendo achado ao pé da Igreja defronte ao mesmo Quartel.

Quartel na Mouraria, 25 de fevereiro de 1848.

Francisco Joaquim da Silveira

Tenente do Estado

 


Proclamação Bahianos

Até onde chegará nossa indiferença pelos males da pátria, oprimida por tanto tempo por uma Côrte altiva, infame e prostituída? Não consintamos que semelhante estado continue, e unidos e fortes levantemos o grito de nossa separação. Bahianos as armas, vitória ou morte.




Proclamação Bahianos

Até quando havemos de sofrer, que uma corte infensa aos nossos interesses zombe de nós, tratando somente de sua grandeza e prosperidade? Até que ponto há de arrasar-nos essa nossa culpável paciência? Basta de padecimentos. Chegou à ocasião de despertamos do profundo sono de indolência, em que por tanto tempo jazemos sepultados. Unamo-nos e levemos a efeito a sagrada causa da separação e independência de nossa província dessa Côrte inimiga. Os nossos irmãos, os briosos pernambucanos e todos do Norte, que tem experimentado o peso do mais cruel despotismo, auxiliam nossa pretensão, que é santa e protegida de céu; porque contém a defesa dos direitos e liberdade de um povo. Honrados e bravos militares, esta causa também é vossa; protegei-a com as vossas armas e valor; nunca elas servirão se não para defesa de nossos mais importantes direitos. União, coragem e atividade coarão nossos esforços vivam os defensores da separação e independência do Norte.

Documento encontrado e gentilmente cedido por Eduardo Cavalcante, profissional em pesquisa histórica, grande conhecedor dos acervos históricos do Rio de Janeiro.

Contato: cvlcnt@gmail.com / cvlcnt@uol.com.br

Fonte: Arquivo Nacional, Série Justiça, Registro da correspondência com diversas autoridades das províncias – Bahia. Limites 1848-1850. Notação I J 1 710.     

 

 

CONSTRUÇÃO DE UMA ARENA PARA TOURADAS EM SALVADOR DO SÉCULO XIX

 

Escritura de trato, ajuste e convenção que fazem Urbano José da Costa, Francisco José de Moraes, Antonio Domingues de Carvalho, João Antonio Maria Pereira, José da Silva Dias e José de Miranda Lima; com José Esteves de Carvalho, da feitura de uma Praça para o espetáculo de Touros, como abaixo de declara.

Saibam quantos este público instrumento de Escritura de contrato, ajuste e convenção ou como em direito melhor nome e lugar tenha e virem, que sendo no ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil oitocentos e dezessete, aos cinco dias do mês de Março do dito ano nesta Cidade de Salvador, Bahia de todos os Santos e meu Cartório aí apareceram presentes partes a esta outorgantes havidos e contratados, a saber de uma parte Urbano José da Costa, Francisco José de Moraes, Antonio Domingues de Carvalho, João Antonio Maria Pereira, José da Silva Dias e José de Miranda Lima e da outra parte José Esteves de Carvalho, aqueles os reconheço pelos próprios de que faço menção e este as testemunhas abaixo me certificaram ser o próprio; e logo por aqueles me foi dito em presença das mesmas testemunhas, que eles tem contratado com o sobredito José Esteves de Carvalho Mestre Carpina, fazer uma Praça no Forte de São Pedro dirigida ao espetáculo de Touros com a extensão de quatrocentos palmos de fundo e trezentos de frente no seu quadro, que preenche no seu circulo cento e oitenta camarotes com oito palmos de frete cada um, e sete de fundo; uma varanda pela sua retaguarda com nove palmos de largura, que será coberta de telha, e ripada de juçara com doze bancos no seu oblíquo circulando a mesma Praça, cujos camarotes terão suas portas de fechar com chave, e toda esta construção sem que haja perfeição, isso sim, segurança, obrigado ele construir e entrega-la pronta pela quantia de quatorze mil cruzados em que se tem ajustado, a pagamentos, a saber o primeiro de um conto e duzentos mil réis que recebe ao fazer desta Escritura; o segundo de dois contos e duzentos mil réis, estando coberta; e o terceiro e último de outros dos contos e duzentos mil réis três dias depois de finda a obra, que todos estes pagamentos perfazem a referida quantia dos quatorze mil cruzados concorrendo ele construtor com todos os materiais, carretos, oficiais e tudo quanto for necessário para a mesma obra, até seu final cumprimento, obrigados somente eles outorgantes a dar armazém pronto para a sua arrecadação e se obrigam também a pagar a ele construtor qualquer inovação que intentarem além da obra aqui ajustada e ele construtor se obriga a dar acabada de toda a mesma obra no dia vinte e três de junho deste corrente ano de mil oitocentos e dezessete; e por que pode acontecer que a estação do inverno embarace por alguns dias o andamento da referida obra, eles outorgantes terão para com ele construtor alguma contemplação, uma que não seja por falta dos materiais que os deve ter prontos para a construção da obra, sem embargo de carestia de preço ou diminuição deste; pois que assim se acham justo com o dito construtor, pelo qual me foi também logo dito que ele aceitava, como logo aceitou a presente Escritura de ajuste trato e convenção com ele feita contadas as cláusulas e condições, e obrigasse dela; e que para segurança da sua parte oferecia por seu fiador a Manoel José de Almeida, o qual presente se achava e por ele me foi dito que por sua pessoa e bens se obrigava, se obriga a tudo quanto se obriga o seu fiado, o construtor José Esteves de Carvalho constante desta Escritura, como se fosse com ele justo; e logo pelos ditos outorgantes me foi dito que eles aceitavam o fiador o referido obrigando-se de tudo quanto se obrigou o seu fiado. E finalmente por eles partes, cada qual no que lhes toca me foi mais dito que eles por suas pessoas e bens se obrigavam a terem, manterem, cumprirem e guardarem a presente Escritura e de nunca a encontrarem, revogarem, reclamarem, nem outra disseram por si, ou por outrem, por ser muito de suas livres vontades feita. Em fé e testemunho de verdade assim me outorgaram e me requereram lhe fizesse este instrumento nesta nota em que assinaram, pediram e aceitaram para se lhes dar os traslados necessários; sendo a tudo presentes por testemunhas as abaixo assinadas. Eu Francisco Teixeira da Mata Bacelar Tabelião a escrevi. José Esteves de Carvalho, Antonio Domingues de Carvalho, Francisco José de Moraes, Urbano José da Costa, José de Miranda Lima, José da Silva Dias, João Antonio Maria Pereira, Manoel José de Almeida.

Fonte:

Arquivo Público do Estado da Bahia

Seção Judiciária, Livro de Notas 191, páginas: 12v a 13v.  

Para saber mais: 

“A los toros!”: as touradas em Feira de Santana(1893-1905) 

AS TOURADAS NA CIDADE DA BAHIA: TRANSIÇÕES NA DINÂMICA PÚBLICA SOTEROPOLITANA

AS TOURADAS DE 1808 


        


COM UM PEDACINHO DE PAPEL, UM PAU NO LUGAR DE PENA E ACENOS RECEBEU A SUA LIBERDADE MARIA LEOCADIA

Em 1817 Thereza Maria de Jesus, provavelmente mulher egressa da escravidão, narrava na carta de alforria de Maria Leocadia pedaços de sua vida. Libertando duas de suas filhas, uma delas muda, a qual ao seu modo pediu a sua Mãe que libertasse a sua cria. 

Cópia da carta de Liberdade da crioulinha Maria Leocadia conferida por sua Senhora Thereza Maria de Jesus

Digo eu Thereza Maria de Jesus, que tendo antes de casada duas filhas, uma de nome Felicia Maria do Sacramento, que a tirei do cativeiro dando por sua Liberdade cento e oitenta mil réis a seu Senhor Manoel José de Faria, e por gratificação desse benefício tratou de cometer dentro da minha casa traição e amizade ilícita, deflorando-se com meu sobrinho e Primo Seu Luis Brandão de Mello casando-se por isso contra a minha vontade por já se achar dele pejada, e ainda mais por caridade sobre o crime cometido do defloramento lhe dei um crioulinho de nome Luis, com dez anos de idade, que logo tratou de o vender a Domingos Pereira por cento e dez mil réis para pagar dívidas feitas com funções e conveniências. E a segunda minha filha de nome Maria Thereza moça muda, a esta fiz doação de uma crioulinha de nome Maria Leocadia, filha da minha escrava manutinida de nome Efigênia nação nagô, logo antes de batizar-se valendo vinte mil réis, a qual minha dita filha muda antes do seu falecimento por acenos e com um pedaço de papel na mão e um pedacinho de pau em lugar de pena sobre o papel, com os olhos na dita crioulinha, que se acha agora com a idade de cinco anos incompletos, me pediu lhe passasse eu Carta de Liberdade, e a mandasse embora, razão por que não obstante ser eu sua herdeira forçada com licença de meu marido o Senhor Antonio Mendes de Jesus, abaixo assinado, a ei por forra, livre e isenta de toda a escravidão como se nascesse de ventre livre, e rogo as Justiças de Sua Majestade Fidelíssima, de um e outro foro que esta façam cumprir e guardar como nela se contém, e quanto por maior validade lhe falte alguma clausula ou clausulas em direito necessários aqui as hei por expressas e declaradas como se de cada uma fizesse expressa e declarada menção, e por não saber ler nem escrever pedi e roguei a Luis Gonzaga de Santa Ana que esta por mim fizesse e assinasse perante as testemunhas abaixo também assinadas. Bahia, dezoito de janeiro de mil oitocentos e dezessete. A rogo de Thereza Maria de Jesus, e como testemunha que esta fiz e assinei por mandato da manumite-te Luis Gonzaga de Santa Ana, Antonio Mendes de Jesus, Joaquim de Santa Ana, Luis de França Vieira. Ao Tabelião Albergaria. Bahia, três de fevereiro de mil oitocentos e dezessete, Simões. Reconheço serem própria por conferência. Bahia, vinte quatro de abril de mil oitocentos e dezessete. Em testemunho de verdade estava o sinal público. Marcelino Epifânio Soares de Albergaria. E copiada a dita carta de Liberdade a qual me reporto, esta conferi, concertei, subscrevi e assinei, e a própria entreguei a quem abaixo a assinou. Bahia, 25 de abril de 1817. Eu Marcelino Epifânio Soares de Albergaria que a subscrevi. Conferida por mim Tabelião.  Marcelino Epifânio Soares de Albergaria.        

Fonte: Arquivo Público do Estado da Bahia, Seção Judiciária, Livro de Notas 192, páginas: 38v/39.