Piratas além do Caribe


Ricardo Barros Sayeg*

Estreiou no dia 20 de maio, no Brasil, o novo filme da Disney, Piratas do Caribe: em marés estranhas. A nova película estrelada por Johnny Depp, Penélope Cruz, entre outros, certamente terá uma excelente bilheteria. O tema, entretanto, está longe de ser apenas ficção. Os piratas existiram de verdade e encheram principalmente os cofres do governo da Inglaterra, entre os séculos XVI e XVII. Muitos vieram ao Brasil, saquearam cidades como Santos e Recife e assaltaram diversos navios que carregavam riquezas da Europa para o Brasil e da colônia para o Velho Mundo.

Todavia, não era nada fácil a vida de um pirata, como mostram as aventuras do personagem Jack Sparrow na saga Piratas do Caribe, agora em sua quarta edição. Um desses saqueadores do mar foi Antony Knivet, que deixou suas memórias registradas em um livro chamado As incríveis Aventuras e os Estranhos Infortúnios de Antony Knivet. Esse pirata saiu da Inglaterra em 1591, acompanhado por um mestre em saques e pilhagens chamado Thomas Cavendish, quando essa prática era bastante comum e inclusive incentivada pela coroa britânica. Como a região do Caribe estava infestada de piratas, resolveram partir para o Brasil, uma região até então bastante desconhecida pelos europeus. As terras brasileiras prometiam muitas surpresas e várias delas tornaram-se bastante desagradáveis.

Logo na chegada ao litoral brasileiro, Knivet foi abandonado por seu colega e foi capturado pelos portugueses que tentavam naquele momento defender a costa tupiniquim de ataques inimigos. Para piorar sua situação, quando conseguiu fugir dos portugueses, o pirata caiu nas mãos de índios canibais. Os nativos comeram quase todo mundo que acompanhava Knivet, mas o deixaram vivo, para poder contar sua história. O aventureiro conseguiu escapar novamente, fugiu para a África e novamente foi reconduzido ao Brasil. Podemos concluir que o pirata, tal como Jack Sparrow, tinha uma enorme falta de sorte e uma tendência enorme para se envolver em enrascadas.

O livro foi escrito pelo pirata em 1625 e inclui diversas ilustrações com a descrição de portos, baías e enseadas utilizadas como refúgio por muitos navegadores do século XVI. Ele sugere no texto que a corrupção no Brasil é endêmica e por diversas vezes cita alguns casos envolvendo propina paga a agentes do governo português na época.

Outro pirata da vida real foi Thomas Cavendish. Em nome da coroa britânica, ele participou da fundação da colônia da Virgínia, na América do Norte, em 1585, comandando um navio da frota de Sir Richard Grenville. Em 1586, Cavendish foi o terceiro homem a dar a volta ao mundo, retornando para a Inglaterra, em 1588.

Como corsário, Thomas Cavendish se notabilizou pelo ataque à costa paulista na época da União Ibérica, quando as duas monarquias estavam unidas por um problema envolvendo a sucessão portuguesa ao trono. Saqueou as vilas de Santos e São Vicente, em 1591, destruindo a instalação de uma indústria canavieira na província de São Paulo. Em 1592, após uma tentativa fracassada de invasão de Vitória no Espírito Santo, Cavendish seguiu sua viagem para o norte, mas acabou morrendo devido aos ferimentos da batalha.

Hoje, a pirataria tem alguns aspectos diferentes: perdeu o glamour e a aventura do passado e tornou-se uma atividade de ladrões organizados. Até maio deste ano já foram registrados mais de duzentos ataques piratas. Os dados são do IMB, sigla inglesa para o Escritório Marítimo Internacional, uma divisão da Câmara Internacional do Comércio, que combate todo tipo de crimes e más práticas relacionadas aos negócios.

Evidentemente, os piratas atuais não estão mais atrás de baús de tesouros como antigamente. Seus alvos prediletos são navios de todos os portes: desde pequenas embarcações até petroleiros! Outra inovação dos tempos atuais é o pedido de resgate feito em função do sequestro de passageiros. Um dos pontos de maior incidência desse tipo de ação é a costa da Somália, no leste da África.

Piratas do Caribe: em marés estranhas é ambientado no século XVII, entretanto, muitas das histórias contadas são baseadas em fatos reais. Naquela época, a coroa inglesa dividia o resultado dos saques com os corsários e incentivava a pirataria. Uma página não tão nobre para aquela que seria a maior potência do mundo no século XIX.

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* Ricardo Barros Sayeg é Professor de História do Colégio Paulista, mestre em Educação pela Universidade de São Paulo, formado em História e Pedagogia pela mesma universidade.