Ainda de pouco conhecimento da sociedade é o fato de hoje, 25 de
maio, se comemorar o Dia da África. Data escolhida porque em 1963 a
Organização de Unidade Africana, hoje com o nome de União Africana, foi
fundada com o objetivo de ser, internacionalmente, a voz dos africanos.
Hoje, o Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá está recebendo uma média de
cinquenta professores da rede municipal, juntamente com o seu
secretário, para conosco comemorar este dia, que se constitui em uma
tentativa de que os olhos e os corações do mundo se preocupem e se
ocupem de cuidar do povo desse continente, mas também de aprender e
apreender sua sabedoria, que, como neta de africana e iniciada em uma
religião que tem em África sua matriz, foi a mim transmitida.
Oportunidade que tudo faço para não desperdiçar.
Muitas sementes da sabedoria dos africanos, em mim plantadas,
ainda não encontraram terreno fértil para germinar, mas não desisto e,
por isso, cuido desse terreno em todo momento. Outras há, no entanto,
que cresceram e até deram frutos. Foi assim refletindo que resolvi
homenagear o berço da humanidade – a África -, aproveitando este
precioso espaço de comunicação que a mim foi concedido para,
humildemente, tentar espalhar essas sementes, na esperança que elas
caiam em terrenos férteis.
Foi através da tradição oral, chamada na língua yorubá de ipitan,
que entrei em contato com a maravilhosa arte de viver do africano, que
tem na alegria um de seus fundamentos. Entretanto, nós brasileiros, que
temos nesse povo uma de nossas descendências, não devemos correr o risco
de sermos megalomaníacos e considerar a filosofia africana a melhor.
Todo povo possui sua sabedoria, mas a Sabedoria, assim como Deus, é uma
só. A mesma base, os mesmo fundamentos, apenas transmitidos de acordo
com a cultura e o lugar de viver correspondente. Se foi através da
tradição oral que aprendi, é agora na escrita, iwe-kikó, que encontro
condições favoráveis para transmitir, a um maior número de pessoas, os
ensinamentos absorvidos e os quais ainda pretendo assimilar, de maneira
profunda.
Conheçamos, então, um pouco do muito que possui a filosofia do povo africano:
Conheçamos, então, um pouco do muito que possui a filosofia do povo africano:
- A palavra tem o poder de materializar o que existe em potencial no
universo, por isso os africanos falam muito e alto, quando precisam
canalizar sua energia em direção ao que é essencial, mas silenciam nas
horas necessárias. Um orin faz entoar: “Tè rolè... Mã dé tè rolè. Báde
tè role” = “Eu venero através do silêncio... Eu pretendo cobrir meus
olhos e calar-me. Ser conveniente, respeitando através do silêncio”.
- Nosso maior inimigo (como também nosso maior amigo) somo nós mesmos: “Dáààbòbò mi ti arami” = “Proteja-me de mim mesma”.
- O cuidado com o julgamento do outro e também com o instinto de
peversidade: “Bí o ba ri o s'ikà bi o ba esè ta ìká wà di méjì” = “Se
vir o corpo de um perverso e chutá-lo, serão dois os perversos”.
- O respeito às diferenças: “Iká kò dógbà” = “Os dedos não são iguais”.
- A necessidade de um permanente contato com a Essência Divina que
cada um possui: “Eti èmí óré dé ìyàn. Àroyé èmí óré dé ìyà” = “Na
dificuldade de decisão e no debate, a Essência Divina amplia a visão
para argumentar”.
Como se vê, o corpo da tradição oral africana, que é composto de itan
– mito; oriki – parte do mito que é recitada em forma de louvação e
vocação; orin – cântico de louvação; adurá – reza; ówe – provérbio serve
para nos disciplinar. Entretanto, nenhuma sabedoria tem mais valor do
que a filosofia do ìwà, palavra que pode ser traduzida como conduta,
natureza, enfim, caráter. Devemos estar atentos aos nossos
comportamentos. Pois, como falam os africanos após enterrar um amigo, “ó
kù ó, ó kù ó ìwà ré”, querendo dizer, “não podemos lhe acompanhar no
resto de sua viagem, agora só fica você e seus comportamentos”.
ACESSE A FONTE:
* Artigo publicado na editoria Opinião do Jornal A Tarde, no dia 25/05/2011