Reprodução de tela de Rugendas
Escravos
prosperavam comprando negros, mas eram esnobados pela elite
Africano
chegou a figurar entre os dez homens mais ricos de Salvador
POR
RENATO GRANDELLE
30/05/2015
6:00
BRAGA,
Portugal — Quando Manoel Joaquim Ricardo morreu, em 1865, tinha 27 escravos,
três casas e uma senzala. Era um dos dez homens mais ricos de Salvador. É um
grande feito, ainda mais considerando que Manoel era negro e vivia em um país
ainda escravocrata.
Em
1841, antes mesmo de ser alforriado, Manoel já era dono de seis escravos.
Estendeu sua rede de negócios até a África. Lá, ele e seus sócios trocaram
correspondência sobre seu sucesso na importação de “noz de cola” — segundo
autoridades britânicas, este era um código para “escravos”. Embora o tráfico
negreiro ainda não tivesse sido abolido, a opinião pública era cada vez mais
resistente ao trabalho forçado dos negros.
— Mais
de 600 escravos eram donos de escravos no Nordeste — revela João José Reis,
professor da Universidade Federal da Bahia. — Esta prosperidade estava ligada
ao tráfico negreiro. Quando havia grandes desembarques nos portos brasileiros,
o preço deles diminuía e permitia a inclusão de pequenos investidores no
mercado. Manoel e outros libertos compravam preferencialmente mulheres, que
lhes davam crias.
Professor
de História da Unifesp, André Roberto de Arruda Machado destaca que a relação
entre os negros era desigual.
— Os
escravos não formavam apenas um corpo. Havia uma hierarquia evidente entre os
escravos nascidos aqui e aqueles que vinham da África. O primeiro grupo se
recusava a fazer algumas tarefas, que deveriam ser deixadas aos estrangeiros —
lembra.
Mesmo
acumulando riquezas e escravos, Manoel nunca obteve reconhecimento na sociedade
baiana.
— Com a
hostilidade e a negação do africano liberto, perdemos a chance de ter uma elite
negra — lamenta Reis. — Os africanos eram trazidos para cá em fétidos tumbeiros
e não poderiam ver o Brasil como uma terra de oportunidades. Apenas procuravam
se dar bem dentro do possível, e esse possível às vezes surpreende.
(O
repórter viajou a convite do Festival de História)
ACESSE A FONTE: