A HOMENAGEM QUE DESOMENAGEIA



A HOMENAGEM QUE DESOMENAGEIA
Maria Isabel Vitória de Carvalho*


Somos seres simbólicos. Deve ter sido para atender a esta dimensão, que houve por bem ao Governo da Bahia, através da SEPROMI – Secretaria de Promoção da Igualdade, evocar exemplos de mulheres baianas que se destacaram na luta pela transformação social na campanha “O Poder de Mudar a História – Isso é Coisa de Mulher” e divulgá-los, através de cartazes, busdoors, outdoors e inserções em rádio, buscando, certamente, difundir perante toda a coletividade o papel positivo desempenhado pelas mulheres que, no dia-a-dia, enfrentam as mais diversas e desiguais lutas para garantir a própria sobrevivência e de suas famílias.

Estão compondo esta homenagem Luiza Mahin, Maria Quitéria, Loreta Valadares, Mãe Stela de Oxossi, (...) e Neide Candolina – Educadora Baiana. Pergunto-me quem é, ou foi, Neide Candolina, além de uma criação artística de Caetano Veloso? Sim, Caetano, livremente como convém a toda criação artística, homenageou duas mulheres que admira, fundindo suas características: Neide, proprietária do Zamzibar, e Candolina Rosa de Carvalho Cerqueira, de quem foi aluno no Severino Vieira. O traço em comum? O prazer de servir o alimento, seja do corpo físico, seja do corpo mental, espiritual, refletido na integridade de suas ações.
Pois bem, na peça oficial, a imagem da Professora Candolina é associada ao título da música! O Estado da Bahia não sabe que Candolina Rosa de Carvalho Cerqueira, que nomeia uma escola de sua rede de ensino no bairro de Pau Miúdo, não se chama Neide Candolina! As peças – que, ressalte-se, neste caso aparentam cumprir a finalidade de informar, constitucionalmente prescrita à publicidade oficial – foram elaboradas sem a consulta à família nem mesmo para obter uma foto verdadeira e sem pesquisa às fontes existentes, a exemplo da página sobre a homenageada na wikipédia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Candolina_Rosa_de_Carvalho_Cerqueira), do caderno Repórter do Correio da Bahia de 16/04/2006, e de dois livros: GUIMARÃES, G. A invisibilidade das educadoras baianas na História da Educação: a experiência de Candolina Rosa. Salvador. UFBA, 2008 e PASSOS, E. Candolina Rosa de Carvalho. Salvador: EDUFBA - Editora da Universidade Federal da Bahia, 2006. v. 1. 80 p. Coleção "Educadoras Baianas". O título do primeiro livro citado (grifo nosso) talvez traduza melhor o ocorrido...
Na superficialidade, a homenagem se perde. A essência da trajetória é desprezada. A Educadora continua invisível. O trabalho de profundidade é relegado. A fama instantânea, midiática, é o que prevalece. Divulgam-se, oficialmente, inverdades. E só nos resta constatar que, quase 40 anos após a morte de Professora Candolina, ainda não conseguimos colocar em prática seu exemplo e levar a Educação a sério, como merece o único processo capaz de transformar emancipatoriamente uma nação.
                                                        * Maria Isabel Vitória de Carvalho é sobrinha de Profa. Candolina.