PARA ALÉM DOS NÚMEROS

Por Alex Sander Alcântara

Agência FAPESP – É comum ouvir que haveria uma menor produtividade na pesquisa em ciências humanas em relação a outras áreas do conhecimento. Ou que a pesquisa feita em humanidades no Brasil não teria a penetração internacional das demais áreas.
Para debater pontos como esses, pesquisadores se reuniram no 1º Fórum de Ciências Humanas, promovido pela Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade Estadual Paulista (Unesp) no fim de novembro. Os participantes analisaram eventuais entraves da pesquisa em humanas, como a falta de uma metodologia apropriada para medir a produção e a necessidade de projetos mais ousados na área.
Segundo os cientistas presentes, não se pode dizer que a produtividade nas humanidades seja menor do que as das demais áreas a partir de critérios meramente quantitativos.
Para o professor Luiz Henrique Lopes dos Santos, do Departamento de Filosofia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP), essa discussão tem se pautado na maior parte das vezes em análises superficiais de números.
“O mito da baixa produtividade está ancorado em uma leitura simplista dos dados, que ignora as especificidades de cada área. A questão é saber o que significa cada número em cada área e, por vezes, em cada linha de pesquisa”, disse à Agência FAPESP.
Segundo o pesquisador, que apresentou dados sobre a produção de artigos científicos nos últimos anos, em muitas áreas a pesquisa é realizada em grupo e resulta em trabalhos de coautoria, o que não ocorre com frequência nas humanidades.
“A publicação de livros nas humanidades, por exemplo, é superior à de muitas áreas. Em um cálculo grosseiro, podemos dizer que um livro equivaleria a seis artigos. O problema é que um livro ou um artigo tem o mesmo peso de cálculo se forem citados em outras publicações”, disse Lopes dos Santos, que integra o quadro de Coordenadores Adjuntos da FAPESP.
Mariana Broens, professora de Filosofia da Unesp de Marília, também destacou a importância de se desenvolver pesquisas em conjunto em ciências humanas e questionou a forma como a pesquisa costuma ser feita. “Será que o modelo de produção solitária, individual e contemplativa pode responder aos desafios da contemporaneidade?”, indagou.
Internacionalização da pesquisa
Outro ponto considerado delicado pelos participantes do fórum, para a maioria das áreas em humanidades, foi a questão da internacionalização da pesquisa. “Em muitas áreas, a agenda interessante de pesquisa para o Brasil pode não coincidir com a pauta internacional dominante, mas pode coincidir com as agendas regionais”, disse Lopes dos Santos.
O pesquisador também destacou especificidades da produção em ciências humanas. Escrever em português, e não em inglês, por exemplo, pode ser visto como um entrave. Mas a forma do discurso nas humanidades não seria apenas um meio de transmitir um conteúdo, e sim um elemento constituinte da própria área.
“Em certas áreas, tem-se um discurso enxuto, recheado de termos técnicos. Nas humanidades, a qualidade do texto é inseparável do conteúdo. É muito difícil que alguém que não tenha o inglês como sua primeira língua escreva com a desenvoltura ideal para usar todos os recursos expressivos da filosofia e da literatura, por exemplo”, disse.
Lopes dos Santos buscou também desmistificar a ideia de que as humanidades são preteridas pelas agências de fomento à pesquisa. Citou dados dos Estados Unidos, onde o setor recebe 9% de todo o investimento anual em pesquisa. Na FAPESP, o percentual para esse segmento é de cerca de 11%. “E em geral os projetos em humanidades têm custo menor, porque não demandam aquisições de equipamentos caros”, ressaltou.
Entretanto, tem havido poucas solicitações de financiamento para projetos de pesquisa de médio e grande porte para as humanas. “Há espaço para projetos mais arrojados, principalmente em pesquisa aplicada em políticas públicas. Mas noto uma certa timidez dos pesquisadores em propor pesquisas mais ambiciosas”, disse.
“Ousadia é a palavra que a área de humanas precisa perseguir com mais afinco”, corroborou Maria José Giannini, pró-reitora de Pesquisa da Unesp. Segundo ela, é necessário reunir competências de diferentes unidades e instituições de pesquisa.
“Um caminho para isso seria divulgar mais os projetos, buscar contatos e parcerias e utilizar melhor as ferramentas de apoio que cada instituição oferece”, disse a também conselheira da FAPESP.