Por maiores os títulos do Arquivo Nacional, na
capital do país, para deter, guardar e conservar consigo tudo quanto interesse
as tradições escritas da nacionalidade, lícito não lhe não será, entretanto,
despojar o Arquivo Público da Bahia de documentos que lhe pertencem, por
ligados a fato que, embora de História Nacional, aqui ocorreram, sendo,
portanto, sobretudo, acontecimentos tradicionais da História Baiana.
Sobre o assunto, o governo do Estado dirigiu o
seguinte ofício ao Excelentíssimo Senhor presidente da República: Em 30 de
novembro de 1936.
3.934 – Senhor presidente. – A 16 de setembro de
1887, o ministro do Império, Francisco Belisario Soares de Souza, dirigiu ao
presidente da província da Bahia o ofício do teor seguinte, do qual junto a
este uma cópia autêntica, e cujo original se conserva no arquivo público deste
Estado: “Sirva-se Vossa Excelência, dar as necessárias ordens para que sejam
entregues, mediante recibo, ao chefe da Seção da Biblioteca Nacional, Alfredo
do Valle Cabral, que se acha com licença nessa província, afim de serem catalogados,
extratados ou impressos, não só os volumes de registros mandados fazer pelo
governador Dom Fernando José de Portugal, os quais compreendem o período da
fundação da cidade da Bahia, até a expulsão dos holandeses do Brasil – (1549-1654);
como também outros documentos relativos ao mesmo período, que não estejam incluídos
no coleção mandada fazer pelo mesmo governador: devendo ser-lhe entregue cada
volume de sua vez e depois de restituído o que tiver recebido anteriormente, de
modo que toda a coleção possa ser estudada”.
Trata-se, como se vê, e nem podia ser de outra
forma, de um empréstimo de documentos, os quais, todos, sob essa condição foram
remetidos a Biblioteca Nacional, que devia receber casa volume de sua vez, e
somente depois de restituído o volume anterior, poderia receber outro. Houve,
pois, cuidado de se evitar que a Bahia fosse, de qualquer modo, desapossada de
uma grande parte do seu patrimônio histórico. Era um empréstimo caracterizado,
e sob condição previdente, que assegurava a devolução dos volumes emprestados. Entretanto,
a verdade é que a Biblioteca Nacional, contra compromisso solenemente assumido
pelo governo do Império, acumulou nas seções dos documentos que pertencem a
Bahia, e há anos os retêm nas suas seções. Também não me consta que houvesse
jamais governo que procurasse reaver o patrimônio do Estado.
A Bahia, porém, é que tem sofrido, e sofre, as consequências
deste estado de coisas. Assim é que, por exemplo, entre documentos emprestados,
está um e dos demais importantes a defesa do seu território, na questão de
limites com Sergipe: o regimento, dado pelo governador da Bahia, para fundação
da aldeia de Curaça, que Sergipe diz lhe pertencer. No rol dos mesmos
documentos se encontra o tombamento ou auto da demarcação e confrontação das terras
que pertenciam ao Rei em Ilhéus, e Belmonte, a mais rica zona cacaueira do
Estado de onde a disputa da posse da terra tem dado lugar a toda a sorte de abusos,
a falta da preciosa documentação, retida na Biblioteca Nacional.
A máxima parte da vida histórica e administrativa
da Bahia se acha fora dos seus arquivos: tudo o que diz respeito a fundação da
cidade, numa vasta coleção de provisões reais; grande parte da correspondência,
das ordens, das portarias da administração baiana; todos os registros da
secretaria do governo da Bahia, compreendendo não só toda administração
colonial, como também notável porção, correspondente ao período da
independência.
Se caso o governo da Bahia carece consultar
qualquer documento da sua mesma propriedade, é preciso que peça autorização
para esse fim, coo agora mesmo está ocorrendo no que concerne a demarcação das
terras do sul do Estado. Se resolve comemorar o seu passado histórico, tem de
mandar copiar documentos respectivos, dispensando com isso, como tem feito,
contos de réis.
“Nem foi só em 1887 que a Bahia emprestou ao
governo do Império e até ao da República, peças notáveis do seu arquivo. A
exposição realizada no Rio de Janeiro no ano de 1881, a Bahia se fez
representar por uma copiosa remessa de manuscritos, livros, retratos, etc., o
que tudo consta de um catálogo impresso, e do qual uma cópia da relação
respectiva acompanha este ofício. Ainda em 1908, o governo da União, para que
figurasse na exposição daquele ano, a carta régia da abertura dos portos, ato
firmado em 1808, na Bahia, dirigido ao senhor governador e cujo documento
pertence a Bahia.
Todos esses sucessivos empréstimos, ou todas essas
remessas para simples exposição, e que, portanto, nem chegaram a ser empréstimos,
foram ficando retidas na Biblioteca Nacional e, em outras repartições públicas
do Rio de Janeiro.
Tenho a consciência, excelentíssimo senhor
presidente, de que, neste momento, cumpro um os mais elementares deveres do
governo baiano, solicitando de vossa excelência, com o maior calor e empenho,
como de fato aqui solicito, o obséquio da devolução de todos os volumes,
documentos, papéis, livros manuscritos avulsos ou não, retratos, etc., que
pertençam a Bahia, e que no seu arquivo se devem guardar, porque sua
propriedade, seu patrimônio histórico, instrumentos da defesa dos seus direitos
e da sua mesma fortuna pública.
Para esse fim se apresentarão a vossa excelência,
incumbidos de procederem a tudo quanto a esse propósito se faça mister, os
senhores doutores Braz do Hermenegildo do Amaral e Homero Pires, para os quais
pelo a vossa excelência toda a atenção do seu espirito de justiça, certo de que
a fará inteira a Bahia, que ainda há pouco galharda e entusiasticamente recebeu
a vossa excelência e a quem ela ficará assim a dever mais de um dos grandes e
inestimáveis benefícios da benemérita administração de vossa excelência.
Valho-me da oportunidade para renovar a vossa
excelência as homenagens do meu elevado apreço e distinta consideração.
Assinado – Juracy M. Magalhães. Governador. Ao excelentíssimo senhor doutor
Getúlio Vargas, DD. Presidente da República”.
Acesse a fonte: A NOITE, terça-feira, 6 de julho de 1937.