Administrador
da Quinta e Hospital dos Lázaros 11 de setembro de 1870.
Ontem à tarde, tinha eu descido à horta deste Estabelecimento a ver aí o serviço,
quando vi na estrada, caminho para a quinta um grupo de negrinhas, dessas que
infelizmente enchem as ruas desta Capital, ofendendo a moral com palavras e gestos, cantando e dançando ao som
de palmas e a modo de africano.
Pouco depois, dirigindo-me a casa, as vi, assentadas umas e outras não, em uns paus destinados à obra que se está fazendo nas casas contíguas e existentes defronte delas, havendo entre as mesmas alguns capadócios, adequados companheiros de tal gentalha. Encaminhando-me para minha sala, levantei uma vidraça, cheguei à janela, d'onde depois de ter sido visto e pouco me demorando, apenas me retirava, ouvi uma voz que na porta da minha morada chamava por uma escrava do Estabelecimento em serviço na cozinha, que fica colocada inferiormente, e com comunicação para um quarto com porta lateral para a da entrada da casa. Voltando à janela, disse estas palavras para uma negrinha que estava à porta: "pretende alguma cousa? Nada tem aí á fazer, retire-se para onde estava", isto por que entendi que não devia consentir que viesse essa neguinha distrair do serviço em que estava a escrava, gritando por ela para dentro de minha casa, embora no pavimento térreo, mas em muita proximidade pela sua pouca altura, sem respeitar a minha presença, pois ali acabava de me ver.
Pouco depois, dirigindo-me a casa, as vi, assentadas umas e outras não, em uns paus destinados à obra que se está fazendo nas casas contíguas e existentes defronte delas, havendo entre as mesmas alguns capadócios, adequados companheiros de tal gentalha. Encaminhando-me para minha sala, levantei uma vidraça, cheguei à janela, d'onde depois de ter sido visto e pouco me demorando, apenas me retirava, ouvi uma voz que na porta da minha morada chamava por uma escrava do Estabelecimento em serviço na cozinha, que fica colocada inferiormente, e com comunicação para um quarto com porta lateral para a da entrada da casa. Voltando à janela, disse estas palavras para uma negrinha que estava à porta: "pretende alguma cousa? Nada tem aí á fazer, retire-se para onde estava", isto por que entendi que não devia consentir que viesse essa neguinha distrair do serviço em que estava a escrava, gritando por ela para dentro de minha casa, embora no pavimento térreo, mas em muita proximidade pela sua pouca altura, sem respeitar a minha presença, pois ali acabava de me ver.
Ao tempo
que assim dizia eu e a negrinha me respondia uma pilheria em tom de mofa, um dos
capadócios que se achava assentado nos ditos paus, com insolência gritou-me que
não se me estava roubando cousa alguma nem se me tirava parte da porta.
Disse-lhe que não me tinha dirigido a ele; que a casa era minha e eu a
governava como entedia, e nada tinha ele que dizer-me.
Em vez de calar-se, continuou a dirigir-se a mim com mais insolência, até que, mandando-o calar, disse-me que não o faria, que eu não era suficiente para o mandar fazer; que era tanto quanto eu etc., etc., etc..
Em vez de calar-se, continuou a dirigir-se a mim com mais insolência, até que, mandando-o calar, disse-me que não o faria, que eu não era suficiente para o mandar fazer; que era tanto quanto eu etc., etc., etc..
Não
devendo pôr-me em razões com esse insolente, contive-me no ímpeto, que senti,
de sair e ir sobre ele, e a esse tempo chegando em direção ao cemitério um cadáver que vinha a ser sepultado, o qual,
pelo que tinha ouvido à sucia, era por ela esperado, para lá se encaminharam
todos, e eu expedi um próprio ao Subdelegado em exercício, a fim de que me
mandasse o ordenança do Juízo. Este veio e, esperando que do Cemitério
regressasse entre os demais da sua súcia aquele insolente, o fiz prender e
recolher a Casa de Correção, onde se acha a disposição de Vossa Senhoria. Seu
nome é João Herculano de Oliveira Mendes.
Quando intimado a prisão, dizendo que nada tinha feito para ser preso, repetiu as insolências referidas, que a negrinha não me tinha ido roubar, que eu não a podia fazer retirar, nem gritar-lhe, nem lhe mandar calar, porque era tão bom como eu, "que nada se lhe podia fazer porque, o que poderia ser era mandá-lo para o sul, que de lá já ele tinha vindo", sendo seus ditos acompanhados pelos saídos dentre os companheiros de "vá, amanhá se sai" ora! que vale isto? Amanhã está na rua etc., etc..
É sabido e escusado é repetir aqui o modo pelo que está entre nós atrevida essa gente. Desrespeita-se a qualquer com a maior sem cerimônia, sem se ter em vista que pode se estar tratando com pessoa de consideração.
A impunidade e outras circunstâncias para isso têm concorrido, e não menos a falta de uma punição correcional para certa ordem de crimes ou faltas, que não podem ser sujeitos a um processo que termine pelo julgamento do Tribunal do Juri, em cujo caso está a de que falo.
Estamos mal e para muito pior iremos, por que esses que lograram voltar da campanha do Paraguai julgam-se com um salvo conduto para tudo quanto quiserem fazer, porque dizem como esse: "não me hão de mandar para o Sul"!
Entretanto, Vossa Senhoria não desconhecerá a necessidade de uma correção para tais casos, e certo estou, esse individuo a encontrará.
Releva acrescentar que referiu-me o guarda, que, depois de o haver querido subornar com a quantia de cinco mil réis para o deixar ir para sua casa, tentou fugir, atirando-lhe com o guarda-sol que trazia, e largando a correr, até que, sempre acompanhado, entrou em uma padaria, onde na carreira que levava também penetrou ele e de lá o recebeu por intermédio de um Inspetor de quarteirão do 1º Distrito, que compareceu nesse lugar.
Quando intimado a prisão, dizendo que nada tinha feito para ser preso, repetiu as insolências referidas, que a negrinha não me tinha ido roubar, que eu não a podia fazer retirar, nem gritar-lhe, nem lhe mandar calar, porque era tão bom como eu, "que nada se lhe podia fazer porque, o que poderia ser era mandá-lo para o sul, que de lá já ele tinha vindo", sendo seus ditos acompanhados pelos saídos dentre os companheiros de "vá, amanhá se sai" ora! que vale isto? Amanhã está na rua etc., etc..
É sabido e escusado é repetir aqui o modo pelo que está entre nós atrevida essa gente. Desrespeita-se a qualquer com a maior sem cerimônia, sem se ter em vista que pode se estar tratando com pessoa de consideração.
A impunidade e outras circunstâncias para isso têm concorrido, e não menos a falta de uma punição correcional para certa ordem de crimes ou faltas, que não podem ser sujeitos a um processo que termine pelo julgamento do Tribunal do Juri, em cujo caso está a de que falo.
Estamos mal e para muito pior iremos, por que esses que lograram voltar da campanha do Paraguai julgam-se com um salvo conduto para tudo quanto quiserem fazer, porque dizem como esse: "não me hão de mandar para o Sul"!
Entretanto, Vossa Senhoria não desconhecerá a necessidade de uma correção para tais casos, e certo estou, esse individuo a encontrará.
Releva acrescentar que referiu-me o guarda, que, depois de o haver querido subornar com a quantia de cinco mil réis para o deixar ir para sua casa, tentou fugir, atirando-lhe com o guarda-sol que trazia, e largando a correr, até que, sempre acompanhado, entrou em uma padaria, onde na carreira que levava também penetrou ele e de lá o recebeu por intermédio de um Inspetor de quarteirão do 1º Distrito, que compareceu nesse lugar.
Deus
Guarde Vossa Senhoria
Ilustríssimo Senhor Chefe de Polícia.
João da Costa Carvalho.
Administrador.
João da Costa Carvalho.
Administrador.
Fonte: Arquivo Público do Estado da Bahia.
Seção Colonial/Provincial.
Correspondência Recebida de Hospitais.
Maço: 6421.
1862-1889.
Correções de J. J. R.