A recente descoberta da localização de um cemitério de escravizados no Campo da Pólvora vem mobilizando pesquisadores de diversas áreas. Documentos disponíveis no projeto resgate pode trazer mais informações sobre a sua história e localização, e desta forma colaborar com a pesquisa arqueológica. Segue aqui transcrição de parte da documentação que trata do tema, trata-se de solicitações do então Arcebispo da Bahia, José Botelho de Matos, que solicita a construção de um cemitério na região do Campo da Pólvora.
Em idos
de 1741, José Botelho de Matos, Arcebispo da Bahia, solicita a construção de um
cemitério em terreno extra muros na Cidade da Bahia. Insatisfeito com a
profanação das tumbas da Sé, que segundo ele: “despejo imundo, cujo
infeccionado vapor chegava insuportável e indecentemente até o altar mor da
dita Sé, amontoando-o mais os cadáveres que no dito adro se vão a sepultura por
essa ser feita por escravos a superfície da terra, e por isso com facilidade
desentranhados dela por animais que os devoram”
Na
tentativa de solucionar a questão, Botelho solicita a construção do dito
cemitério, que seria construído no Campo da Pólvora, para tanto foi enviado
corpo burocrático e feita vistoria no local:
Termo de
vistoria e exame
Ao
primeiro dia do mês de dezembro de mil setecentos e quarenta e um anos, nesta
Cidade do Salvador Bahia de Todos os Santos, na Casa da Pólvora das trincheiras
onde foi o Procurador mor proprietário da fazenda Real deste Estado Luiz Lopes
Pegado Serpa com o Desembargador Manoel Antonio da Cunha Solto Maior Procurador
da fazenda Real e comigo escrivão dela o Sargento maior engenheiro Nicolau
Abreu e Carvalho e o mestre e Juiz do ofício de pedreiro Manoel Antunes Lima,
para efeito de se ver e examinar a área que fica entre a casa da mesma pólvora
e a trincheira imediata para nele se fazer o cemitério na forma da portaria
retro do Excelentíssimo Conde Vice Rei deste Estado, e sendo visto e examinado
o referido sitio, reconhecendo-se a pouca e limitada área dele para se fazer o
cemitério e o grande prejuízo que daquela obra se pode seguir ao serviço de sua
Majestade e dano a sua real fazenda em poder haver algum incêndio causado pelos
pretos que forem enterrar os cadáveres ou o que abrir as sepulturas para eles,
por serem os ditos pretos de gênio de não poderem estar um só estante, que não
tenham liame aceso para os cachimbos, fazendo fogueiras ou fachos, conforme as
farristas e horas, e destes se possa participar faíscas que se introduzam ou
por telhados ou por outra qualquer parte e de qualquer destes acessos seguir-se
incêndio formal que cause o maior dano a toda esta cidade. O que tudo ponderado
pelos ditos Ministros e dito sargento mor engenheiro e mestre pedreiro juiz do
oficio assentaram que de nenhuma sorte era conveniente se fizesse no dito sitio
o referido cemitério, o qual só se podia fazer sem prejuízo algum do serviço
real da defensa das trincheiras e bem comum da cidade no flanco da mesma
trincheira mais para baixo na entrada e caminho que vem da dita casa da pólvora
para a casa do trem, porque nesta paragem, além de ser maior terreno e capaz
para o ministério do dito cemitério, não causa de nenhuma sorte prejuízo algum
a outro qualquer que se lhe possa opor, salvo quando por ordem de sua Majestade
mande o mesmo senhor reedificar novamente as ditas trincheiras que no tempo
presente se acham arruinadas, e de todo o referido mandou o dito Procurador mor
este termo que assinou com o dito Desembargador Procurador Régio, Sargento mor
engenheiro e juiz do oficio João Dias da Costa escrivão proprietário da fazenda
real do estado o escrevi.
Assinaturas...
A íntegra da documentação está disponível em: https://resgate.bn.gov.br/docreader/DocReader.aspx?bib=005_BA_AV&hf=resgate.bn.gov.br&pagfis=46728
Outras informações:
https://www.salvadorescravista.com/lugares-esquecidos/campo-da-p%C3%B3lvora
https://atarde.com.br/salvador/cemiterio-descoberto-em-salvador-deve-ser-escavado-1305239