Brasil dominou tráfico de escravos no mundo


O mais completo banco de dados já organizado sobre o tráfico de escravos no mundo confirma que o Brasil e os portugueses tiveram um papel central no comércio negreiro durante séculos.
Organizado por historiadores da Universidade de Emory, em Atlanta, nos Estados Unidos, e de Hull, na Inglaterra, o banco de dados reúne quase 35 mil viagens de navios negreiros realizadas entre 1501, quando há registro da primeira leva de escravos, e 1867, quando o tráfico foi abolido. O site, a que a BBC Brasil teve acesso, será lançado junto com um volume de ensaios cuja previsão é chegar às livrarias em janeiro de 2008.
O banco de dados é uma volumosa atualização de um CD-Rom lançado em 1999 por Richardson e o historiador David Eltis, de Emory, que continha informações sobre 27 mil viagens de navios negreiros.




Hegemonia


Para pesquisadores brasileiros, a nova edição online é ainda mais importante porque o grosso das informações adicionadas no banco trata de expedições à América Latina, em especial ao Brasil.
Mais de 5,2 mil jornadas de navios brasileiros e portugueses foram mapeadas pela primeira vez. Levando em conta todas as nacionalidades, quase 20 mil viagens que já estavam incluídas na primeira edição ganharam novos dados.
Eltis e Richardson sublinham que os novos dados mostram uma hegemonia de portugueses e brasileiros no comércio de escravos "bem maior do que pensávamos há cinco anos".
Embarcações brasileiras e portuguesas carregaram quase 5,8 milhões de escravos, cerca de 95% deles para o Brasil. Navios britânicos, que o senso comum julga serem os mais ativos no comércio negreiro, levaram cerca de 3,1 milhões.
"Os ingleses, na verdade, não foram os maiores mercadores de escravos, como muitos supõem. Agora, parece que a dominância britânica do tráfico de escravos se resumiu a apenas oito de treze décadas entre 1681 e 1807, entre dois longos períodos de hegemonia brasileira e portuguesa em que a participação britânica foi trivial", escrevem os pesquisadores.

'Chutômetro'

Os novos dados conferem nova dimensão a fatos já conhecidos de historiadores brasileiros, como o de que o comércio de escravos era dominado por agentes baseados no Brasil e não em Portugal – ou seja, na colônia, e não na metrópole.
Estudos conduzidos pelo historiador da UFRJ Manolo Florentino mostraram que três quartos dos mercadores que controlavam o tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro entre 1790 e 1830 eram sediados no Brasil.
Outra informação que o banco de dados contesta é a de que um contingente igual ao dos mais de 10 milhões de escravos que chegaram às Américas morreu na travessia.
O mapeamento indica que 12,5 milhões deixaram a costa africana durante o período da escravatura, ou seja, o número de mortos ficaria em torno de 2,5 milhões.
"Estas estimativas foram feitas em uma época em que se trabalhava com o 'chutômetro'", diz Florentino. "O trabalho de Eltis e Richardson tem o mérito de criar uma padronização, e de aproximar da realidade as estatísticas."

Mar de informação

Usuários poderão examinar de onde saiu e onde chegou cada uma das embarcações, a duração da viagem, quantos escravos foram comprados e vendidos (e a que preço), a nacionalidade do navio e até o nome do capitão.
Na introdução da obra, a ser publicada pela imprensa da Universidade de Yale, os organizadores esperam oferecer subsídios para o que chamam "uma nova era de estudos sobre o comércio escravagista".
Os artigos, assinados inclusive por pesquisadores brasileiros, como o historiador Manolo Florentino, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, oferecerão uma primeira interpretação da mais completa base de dados sobre o tráfico negreiro disponível no mundo.
O professor David Richardson, da Universidade de Hull, explica que a idéia por trás do banco de dados é prover informações para que pesquisadores se debrucem sobre aspectos menos conhecidos do tráfico negreiro.
"Existe uma mudança em relação à pesquisa sobre o tráfico negreiro. Já temos o quadro geral de como a atividade funcionava, agora precisamos desconstruir essas viagens e analisar o que realmente acontecia nos navios", diz Richardson.
"O estudo do dia-a-dia do tráfico negreiro é que vai trazer seres humanos para dentro da História, fazer com que os escravos deixem de ser apenas números."
ACESSE:
http://www.slavevoyages.org/tast/index.faces

Chávez cancela programa "Alô Presidente"

O presidente de Venezuela, Hugo Chávez, cancelou a transmissão de seu programa de rádio e televisão "Alô Presidente", programado para este sábado (30), interrompendo a série de transmissões iniciada na quinta-feira (28).
Chávez, que havia anunciado uma verdadeira "telenovela de quatro dias" para celebrar o décimo aniversário do programa, transmitiu na quinta e na sexta-feira programas de aproximadamente seis horas cada.
Para o programa deste sábado havia sido convocado, de início, um debate entre o presidente Chávez e o escritor peruano Mario Vargas Llosa --crítico do governante venezuelano-- que, depois,
foi descartado pelo próprio mandatário.
"Posso ajudar moderando, mas o debate é entre intelectuais e eu sou simplesmente um presidente, um soldado", disse Chávez no "Alô Presidente" de ontem, ao ratificar que o diálogo deveria ser com os pensadores "revolucionários e socialistas".
Vargas Llosa, o ex-chanceler mexicano Jorge Castañeda e o escritor Enrique Krauze, também mexicano, mostraram disposição em ir ao debate, mas com a condição de falar com Chávez e não com os intelectuais partidários do socialismo com os quais o presidente queria organizar o evento. Depois, o escritor peruano considerou que a proposta de Chávez "nunca foi séria".
Amanhã, Chávez deve transmitir seu programa da região de Guárico
.

JORNAL DE RESENHAS

Em 2001, por ocasião do seu aniversario de 80 anos, o jornal Folha de São Paulo comemorava o fato de que chegava “a ter, com a publicação do caderno diário Ilustrada, do semanal Mais! e do mensal Jornal de Resenhas, cerca de cem páginas de jornal voltadas para a cultura em uma semana”. Bons tempos. De lá pra cá, o jornal cancelou a publicação do caderno de resenhas e diminuiu bastante o espaço dos cadernos culturais (Ilustrada e Mais!). O espaço dedicado aos lançamentos literários, ao debate crítico das publicações, ou mesmo para resenhas mais extensas, se tornou quase inexistente. Esta perda de visibilidade da resenha livresca não é um fenômeno exclusivo deste periódico paulistano. O Estadão, infelizmente, não realiza uma cobertura muito melhor. Até mesmo outras iniciativas editoriais, como a revista Entrelivros, não conseguiram prosperar. Como se sabe, a revista foi cancelada no final de 2007, tendo lançado 32 exemplares. Por tudo isso, é bastante louvável a iniciativa da Discurso Editorial em relançar o Jornal de Resenhas. O caderno agora é publicado sem nenhum vínculo com qualquer grande periódico (mas conta com o apoio do Ministério da Educação, da Caixa Econômica e da Imprensa Oficial do Estado de São Paulo), com uma tiragem elevada (75.000 exemplares), distribuído ao mercado universitário e vendido em bancas e livrarias (por um preço razoável, 3 reais). Dizem que a periodicidade é mensal, porém encontrei esses dias na livraria apenas o primeiro número, de março, por isso não estou certo disso. A publicação é uma iniciativa de um grupo de professores da FFLCH-USP e traz resenhas assinadas por professores da referida universidade, bem como das demais estaduais paulistas (UNICAMP e UNESP) e de federais. Os textos tratam de diversas áreas, no primeiro número há resenhas de livros de história (3), filosofia (3), economia (1), cinema (2), obras literárias (2) e crítica cultural (4), além de um ensaio, assinado por Sérgio Miceli, sobre a obra de juventude de Borges. Os artigos são breves, mas nada que se compare às micro-resenhas da imprensa diária, realizando com sucesso sua proposta de divulgação e debate do mercado de livros. Na falta de uma publicação de grande qualidade, o Jornal de Resenhas é uma iniciativa interessante e feliz, ocupando um espaço meio abandonado pelas demais publicações. Veremos que aparece nos próximos números...
__________________________________________________
Nosso Endereço: Avenida Professor Luciano Gualberto, 315, sala 11Cidade Universitária/Butantã - Cep 05508-900 - São Paulo/SPTelefone: (11) 3814-5383 / Telefax: (11) 3034-2733E-mail: discurso@org.usp.br
______________________________
Colaborador desta postagem: João José Reis

NÃO IGNORE A HISTÓRIA!


O concurso As 7 maravilhas portuguesas no mundo ignora a história da escravidão e do tráfico atlântico. Não deixem isso acontecer.
Há mais ou menos vinte anos, vários países europeus, americanos e africanos vêm afirmando a memória dolorosa do comércio de africanos escravizados e valorizando o patrimônio que lhe é associado. Essa valorização se traduziu não somente na publicação de um grande número de obras historiográficas, mas também se expressou na realização de projetos como A Rota do Escravo iniciado pela UNESCO em 1994.
Apesar das dificuldades e das lutas políticas que envolveram aemergência da memória do passado escravista das nações europeias,americanas e africanas, de dez anos para cá a memória e a história docomércio atlântico passaram a fazer parte da memória pública de muitos países nos três continentes circundando o Atlântico. Em 2001, através da Lei Taubira, a França foi o primeiro país a reconhecer a escravidão e o tráfico atlântico como crimes contra a humanidade. Também na França, o 10 de Maio é doravante “dia nacional de comemoração dasmemórias do tráfico negreiro, da escravatura e das suas abolições”. Em 2001, em Durban na África do Sul, a Terceira Conferência da ONU contra o racismo inscreveu em suas declarações finais a escravidão como“crime contra a humanidade”. Em 1992, na Casa dos Escravos na Ilha de Gorée no Senegal, o Papa João Paulo II expressou suas desculpas pelo papel desempenhado pela Igreja Católica durante o tráfico atlântico.Bill Clinton, George W.Bush, e o próprio Presidente do Brasil, Luis Inácio Lula da Silva, condenaram publicamente a participação passada de seus países no comércio atlântico de africanos escravizados. Em 2006, Michaelle Jean, governadora geral do Canadá, escolheu o Castelo de Elmina em Gana para denunciar o passado escravista. Em 2007, durante as comemorações do aniversário de duzentos anos da abolição do tráfico de escravos pela Inglaterra, foi a vez do ministro Tony Blair expressar publicamente seu profundo pesar pelo papel da Grã-Bretanhano comércio de africanos escravizados.
Em pleno ano de 2009, o governo de Portugal e instituições portuguesas como a Universidade de Coimbra, escolheram um caminho oposto ao descrito acima. No primeiro semestre desse ano essas instituições apoiaram a realização de um concurso para escolher as Sete Maravilhas Portuguesas no Mundo. Na lista das Sete Maravilhas a serem votadas pelo público na internet (
http://www.7maravilhas.sapo.pt/), constam não somente o Castelo São Jorge da Mina (Elmina), entreposto comercial fundado pelos portugueses em 1482, mas também a Cidade Velha (RibeiraGrande) na Ilha de Santiago em Cabo Verde, além de Luanda e da Ilha de Moçambique. Ao descrever esses sítios, a organização do concurso optou por omitir o uso desses lugares para o comércio de escravos. No texto descrevendo o Castelo São Jorge da Mina ou Elmina chegou-se ao cúmulo de afirmar que aquele local foi entreposto de escravos somente apartir da ocupação holandesa em 1637.
Para ser fiel à história e moralmente responsável, consideramos que a inclusão desses “monumentos” no dito concurso deveria ser acompanhada de informações completas sobre o papel deles no tráfico atlântico,assim como sobre seu uso atual. O Castelo de São Jorge da Mina ou Elmina, por exemplo, é hoje um museu que tenta retratar a história do tráfico. Trata-se de um lugar visitado por milhares de turistas de todo o mundo, entre os quais muitos representantes da diáspora africana que buscam ali prestar homenagem a seus ancestrais. O governo português, as instituições que apóiam o concurso e sua organização ignoraram a dor daqueles que tiveram seus antepassados deportados desses entrepostos comerciais e muitas vezes ali mortos. Seria possível desvincular a arquitetura dessas construções do papel que elas tiveram no passado e que ainda têm no presente enquanto lugaresde memória da imensa tragédia que representou o tráfico transatlântico e a escravidão africana nas colônias européias ? Segundo as estimativas mais recentes (
http://www.slavevoyages.org/), Portugal e posteriormente sua ex-colônia, o Brasil, foram juntos responsáveis porquase a metade dos 12 milhões de cativos transportados através do Atlântico.
Em respeito à história e à memória dos milhões de vítimas do tráfico atlântico de escravos, viemos através desta carta aberta repudiar a omissão do papel que tiveram esses lugares no comércio atlântico de africanos escravizados. Convidamos todos aqueles que têm um compromisso com a pesquisa do tráfico atlântico de escravos e da escravidão a repudiar que essa história seja banalizada e apagada em prol da exaltação de um passado português glorioso expresso na suposta"beleza" arquitetural de tais sítios de morte e tragédia.

O Programa de Pós-graduação em História, juntamente com o Departamento de História, da Universidade Estadual de Maringá realizará no período de 09 a 11/09/2009 a quarta edição do Congresso Internacional de História. O objetivo do evento, realizado a cada dois anos, é integrar historiadores, professores, alunos de pós-graduação e de graduação dos mais diversos países, promovendo atividades e debates sobre o atual estado da arte da produção historiográfica. O prazo para envio de resumos vai até até 19 de julho de 2009 e as normas podem ser acessadas no seguinte endereço http://www.pph.uem.br/cih

CURSO: DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE


O projeto Direito à Memória e à Verdade da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República iniciou em 29 de agosto de 2006 com o objetivo de recuperar e divulgar o que aconteceu no período da ditadura no Brasil, 1964 – 1985. São registros de um passado marcado pela violência e por violações de direitos humanos. Disponibilizar esse conhecimento é fundamental para o País construir instrumentos eficazes e garantir que esse passado não se repita mais.
A partir deste projeto a Ágere Cooperação em Advocacy desenvolveu o curso Direito à Memória e à Verdade que será aplicado à distância via Internet, para professores da rede pública de ensino médio, buscando oferecer aos mesmos uma formação, com reflexão crítica e numa perspectiva dos direitos humanos, da história do Brasil durante a ditadura militar. Ao formar professores estaremos garantindo que as gerações atuais e futuras tenham o seu direito à memória e à verdade respeitado.
O curso oferece 3000 vagas e será gratuito para os participantes, pois conta com o apoio da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.

SEMANA DA ÁFRICA

A III Semana da África acontece de 25 a 27 de maio de 2009, em Salvador.
As inscrições em mini-cursos e oficinas vão até segunda-feira, dia 25 demaio, através do endereço eletrônico <semanadaafrica@hotmail.com>
As inscrições de ouvintes serão feitas junto com o credenciamento doevento, dia 25 de maio, a partir das 17:00h, na Reitoria da UFBA.
Maiores informações no site <www.semanadaafrica.blogspot.com>.

REVISTA ÁFRICA E AFRICANIDADES


É com imenso prazer que comunico a publicação da 5ª edição da Revista África e Africanidades. Trata-se de um periódico online com publicação trimestral e acesso totalmente gratuito voltado para divulgação das temáticas africanas e afro-brasileiras. A Revista África e Africanidades é dividida em três partes: a primeira é destinada a publicação de artigos e resenhas acadêmicos; a segunda possui caráter informativo e de entretenimento, voltada para o publico em geral; e por último o Caderno África e Africanidades na Sala de Aula que tem por objetivo subsidiar a prática pedagógica e a formação continuada de docentes da educação básica bem como pesquisas escolares de alunos desse nível de formação. Entre os dias 15 de maio a 15 de julho de 2009 nossa equipe receberá e selecionará contribuições para publicação em nossa 6ª edição (agosto de 2009). Para participar veja regras e linhas temáticas em nosso site.
Acesse http://www.africaeafricanidades.com/
Atenciosamene,
Nágila Oliveira dos Santos
Diretora / Editora

EMPREGUINHO

Um sujeito vai visitar um amigo deputado federal e aproveita para lhe pedir um emprego para o seu filho que tinha acabado de completar o supletivo do 1º grau. - Eu tenho uma vaga de assessor, só que o salário não é muito bom... - Quanto doutor? - Pouco mais de 10 mil reais! - Dez Mil!!!!???? Mas é muito dinheiro para o garoto! Ele não vai saber o que fazer com tudo isso não, doutor!!!! Não tem uma vaguinha mais modesta? - Só se for para trabalhar na assembléia. Meio período e eles estão pagando só 7 mil! - Ainda é muito doutor! Isso vai acabar estragando o menino! - Bom, então tenho uma de consultor. Estão pagando 5 mil reais por mês, serve? - Isso tudo é muito ainda, doutor. O Senhor não tem um emprego que pagasse uns mil e quinhentos ou até dois mil reais??? - Ter eu até que tenho, mas aí é só por concurso e é para quem tem curso superior, pós-graduação ou mestrado, bons conhecimentos em informática, domínio da língua portuguesa, fluência em inglês e espanhol e conhecimentos gerais... além do mais, ele terá que COMPARECER AO TRABALHO TODOS OS DIAS....

LANÇAMENTO DE LIVRO


TRAFICANTES NO PODER



Ao chegar ao Brasil, o governo português soube utilizar o apoio dos homens mais ricos da Colônia: Os comerciantes de escravos. Da noite para o dia, o Rio de Janeiro foi elevado à condição de capital do império português. Mas à época já era um dos principais portos de uma rede comercial que conectava várias partes do mundo. A mercadoria que sustentava essa rede internacional eram os escravos.Com a chegada da Corte, o negócio só fez crescer. Durante os treze anos da permanência de D. João no Brasil (1808-1821), cerca de 250 mil escravos desembarcaram no Rio de Janeiro. Para se ter uma idéia do que isto significa, os Estados Unidos importaram da África, nos 250 anos de sua história escravista, perto de 400 mil escravos.Não é exagero afirmar que as principais riquezas movimentadas na sociedade brasileira dependiam das relações escravistas. Na cidade, a venda de utensílios de todo tipo, frutas e alimentos cozidos (as “quitandas”), além dos serviços, era feita por pequenos comerciantes varejistas. Neste comércio local, uma figura merece destaque: os escravos “de ganho”. Eles pagavam uma diária (chamada “jornal”) aos seus donos e ofereciam ofícios à crescente população urbana. O que o escravo “de ganho” lucrasse a mais, ficava para ele. O comércio entre as capitanias ficava a cargo de negociantes com maior volume de capital, por via marítima ou terrestre – neste caso, utilizando-se dos tropeiros. Montados em mulas, estes homens traziam farinhas, grãos, couro, carne e diversos outros produtos para o Rio de Janeiro, principalmente de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais. E o comércio de longa distância, que ligava a cidade fluminense ao resto do mundo, cabia aos grandes negociantes. Tecidos da Índia, vinho, bacalhau e azeite europeus, prata e ouro sul-americanos e escravos africanos entravam e saíam no porto carioca diariamente.Todas estas modalidades de comércio tinham como elementos mais importantes os escravos, seja como agentes, seja como mercadoria. Eram eles que batiam de porta em porta vendendo alimentos. Era em troca deles que mineiros, paulistas e sulistas plantavam alimentos ou criavam gado para vender no Rio. Era atrás deles que os grandes negociantes atravessavam o oceano rumo à Costa da Mina, Congo ou Moçambique. Os panos da Índia comprados na Ásia não vestiam apenas as cortesãs européias: eram muito apreciados na África. A prata da América espanhola e o ouro mineiro serviam para comprar estes panos, que posteriormente eram trocados por cativos no continente africano.Os três tipos de comércio (local, regional e de longa distância) precisavam de investimentos distintos de capital. É nessa hora que surge a figura do grande negociante, presente em todas as transações. No topo deste grupo, figuravam os traficantes de escravos. O termo traficante não tinha o sentido de ilegalidade dos dias atuais — significava, no período colonial, negociante. No Rio de Janeiro estavam os maiores traficantes de escravos das Américas.Sua prosperidade ganhou impulso com a descoberta de ouro em Minas Gerais na década de 1690, que gerou uma grande demanda de recursos e mercadorias diversas – dos escravos às ferramentas. A partir da segunda metade do século XVIII, estes negociantes, estabelecidos nas proximidades do porto do Rio de Janeiro, dominaram o crédito, as instituições seguradoras, o tráfico de escravos, a importação e a exportação dos produtos. Eram os donos dos maiores navios, os responsáveis pela maior quantidade de viagens, e em 1790 constituíam a principal elite econômica do Brasil. Financiavam até mesmo a elite rural, através de empréstimos para a compra de escravos e manutenção dos caros engenhos.A carreira de um traficante podia ter vários pontos de partida. Normalmente, antes de se tornar um grande mercador, ele passava por ramos menores de comércio e aprendia que especulações e flutuações de preços, fenômenos naturais como calmarias e tempestades, interferiam nos lucros. Portanto, estaria sempre preocupado com prazos e não se concentraria em uma única atividade comercial.Isso explica por que os comerciantes de escravos eram responsáveis por grande quantidade de empregos diretos e indiretos, nos quatro continentes: na Europa, maquinários de última geração eram comprados para seus navios; na Ásia, famílias inteiras trabalhavam na produção e transporte dos tecidos que comercializavam; na África, chefes tribais e suas cortes adquiriam prestígio com os panos da Índia e diversos outros produtos. As sociedades africanas acabaram reorientando suas economias para encher de escravos os navios negreiros, e com isso intensificaram-se bens e serviços específicos para atender às demandas daquele comércio, como a venda de alimentos e bebidas, o funcionamento de presídios (praças-fortes portuguesas) e a manutenção de embarcações.Da mesma forma, o capital movimentado por esses homens no Rio de Janeiro era imenso. Deles dependia uma vasta cadeia de profissionais: pilotos para navegação; médicos e cirurgiões para cuidar dos escravos enfermos e enfraquecidos por semanas trancafiados nos “tumbeiros” (como também chamavam os navios negreiros); ferreiros, marceneiros e carpinteiros para cuidar dos maquinários, móveis e ferramentas de seus navios e escritórios; “línguas” (intérpretes) para facilitar a comunicação com cidadãos e escravos oriundos de terras distantes; caixeiros e advogados para ajudar nas questões contábeis e jurídicas; tanoeiros para fazer tonéis que guardavam comida e água da tripulação e dos prisioneiros (uma lei portuguesa de 1684 obrigava que se servisse 1,4 litro d’água e comida três vezes ao dia para cada escravo durante a travessia da África à América); marinheiros e soldados para a segurança e serviços que o navio exigia.Como se pode imaginar, as relações dos traficantes não se restringiam aos escravos e à gente comum. Quando D. João chegou ao Rio de Janeiro, encontrou esta elite de negociantes já credora das principais famílias da terra. Na cidade que se tornara residência real, boa parte das lojas, armazéns, casas térreas, sobrados e prédios urbanos pertenciam a eles. Isso sem contar os terrenos, sítios e fazendas que faziam parte do seu diversificado rol de investimentos. Num destes terrenos, em São Cristóvão, o traficante Elias Antônio construiu respeitável residência. O local era imenso e, para os padrões brasileiros, suntuoso.O Palácio da Boa Vista (depois Paço de São Cristóvão e atual sede do Museu Nacional), foi oferecido pelo comerciante a D. João. Seria uma residência bem mais apropriada ao monarca, que até então morava na sede do vice-reino do Brasil, atual Paço Imperial, na Praça XV. O príncipe-regente aceitou o mimo de bom grado. Um pouco afastado da corte, o palácio atendia a diversas funções de trabalho e lazer da casa real, recebendo transformações ao longo dos reinados de D. João, D. Pedro I e D. Pedro II.A doação do palácio a D. João demonstra a ligação da corte com a nata de comerciantes da cidade. Com negócios no Oriente, África e diversas regiões do Brasil, Elias Antônio Lopes estava entre os mais importantes mercadores do Rio de Janeiro. E esta não havia sido sua primeira doação à família real. Logo após o desembarque da comitiva lusitana, em 7 de março de 1808, D. João passou diversas listas de “subscrições voluntárias” para remediar as necessidades financeiras da corte. A primeira lista traz o nome de Lopes e de vários outros traficantes de escravos, como José Ignácio Vaz Vieira. Ambos, apesar de praticarem atividades nada enobrecedoras para o perfil aristocrático (que desprezava a atividade comercial), souberam se articular com a família real, a ponto de receberem o cobiçado hábito da Ordem de Cristo. Elias Antônio Lopes, que faleceu em 1815, viveu apenas sete anos ao lado de sua majestade, tempo suficiente para freqüentar a vida palaciana e receber favores reais como a nomeação de Fidalgo Cavaleiro da Casa Real e o título do Conselho de Sua Majestade.Tais comerciantes alimentaram a sociedade brasileira com escravos até 1850, quando o Império proibiu o tráfico negreiro. Mas durante décadas, desde a chegada da corte, eles alcançaram um novo status social, quando o governo português instalado no Brasil lançou mão, para o seu sustento, das fortunas destes negociantes, construídas através do tráfico de almas.

Rodrigo de Aguiar Amaral é doutorando em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), professor na Pós-Graduação em História da África e do Brasil das Faculdades Integradas Simonsen e autor da dissertação Nos Limites da Escravidão urbana: A vida dos pequenos senhores de escravos na Urbes do Rio de Janeiro, c.1800-c.1860 (UFRJ, 2006).

Saiba mais:
CAVALCANTI, Nireu Oliveira. “O comércio de escravos no Rio setecentista”, in FLORENTINO, Manolo. (org.) Tráfico, Cativeiro e Liberdade. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2005.
FLORENTINO, Manolo. Em costas Negras: uma história do tráfico de escravos entre a África e o Rio de Janeiro: séculos XVIII e XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.
FRAGOSO, João Luís Ribeiro. Homens de grossa aventura: acumulação e hierarquia na praça mercantil do Rio de Janeiro (1790-1830). Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1992.
MALERBA, Jurandir. A Corte no exílio. Civilização e poder no Brasil as vésperas da independência (1808-1821). São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
_____________________________________________________
Revista de Historia da Biblioteca Nacional -Postado por Eduardo Marculino